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Crítica do filme Ne Zha 2 O Renascer da Alma

O cinema de animação chinês, com sua força crescente e sua capacidade de transcender barreiras culturais, alcançou um novo patamar de prestígio com a chegada de “Ne Zha: O Renascer da Alma”. Este não é apenas mais um capítulo, mas uma verdadeira epopeia que aprofunda o universo mitológico já estabelecido pelo aclamado predecessor de 2019, solidificando a visão do diretor Yu Yang, um artista que tem se mostrado um mestre na reinvenção de contos ancestrais para uma audiência global. O filme se insere com maestria no Fengshen Universe, expandindo suas fronteiras narrativas e visuais de uma maneira que poucos poderiam prever, marcando o calendário cinematográfico de 2025 como um evento de proporções monumentais, um fenômeno de crítica e público.

A trama se desdobra após os eventos cataclísmicos que deixaram Ne Zha e Ao Bing como almas descorporificadas, um ponto de partida que imediatamente eleva o escopo dramático. A busca pela reconstrução de seus corpos, através da preciosa flor de lótus de sete cores, torna-se a espinha dorsal de uma jornada que é tanto física quanto espiritual. Yu Yang, que assume também a autoria do roteiro, tece uma tapeçaria complexa onde os temas de destino, rebelião contra a injustiça sistêmica e a redefinição do heroísmo são explorados com uma profundidade rara em animações. O roteiro se esforça para quebrar a dicotomia simplista de bem e mal, conferindo a Ao Bing um espaço e um desenvolvimento que não existiam na mesma proporção no filme anterior, enriquecendo a dinâmica entre os protagonistas e suas complexas relações com o mundo e consigo mesmos.

A direção de Yu Yang é uma força motriz por trás da imersão no filme. Cada quadro é uma pintura em movimento, onde a cinematografia eleva a animação 3D a níveis de exuberância e detalhe que estabelecem um novo padrão para a indústria chinesa. A paleta de cores é vibrante e expressiva, e a fluidez da animação permite que as sequências de ação sejam não apenas emocionantes, mas também coreografadas com uma precisão que rivaliza com os melhores filmes de fantasia de artes marciais. A capacidade do diretor de harmonizar os visuais grandiosos com a intimidade das jornadas pessoais dos personagens é notável, criando um espetáculo que é, ao mesmo tempo, grandioso e profundamente humano. Os dragões marinhos, que ameaçam a Passagem de Chen Tang, não são meros vilões, mas catalisadores para a evolução dos personagens, forçando-os a confrontar seus passados e a abraçar um futuro incerto, onde sacrifício e amizade são testados.

As atuações vocais são fundamentais para a ressonância emocional da narrativa. Os principais nomes do elenco, incluindo Lü Yanting e Han Mo, emprestam suas vozes com uma nuance que confere autenticidade e vulnerabilidade aos seus personagens, permitindo que o público se conecte profundamente com as dores e triunfos de Ne Zha e Ao Bing. É através dessas performances que a luta interna dos heróis para encontrar seu lugar no mundo e confrontar seu destino se manifesta de forma crível e cativante. A trilha sonora, um elemento muitas vezes subestimado, aqui é uma extensão orgânica da narrativa, pontuando os momentos de tensão, heroísmo e melancolia com uma sensibilidade que amplifica cada cena, contribuindo para a imersão total do espectador neste universo fantástico.

Em última análise, “Ne Zha 2: O Renascer da Alma” é uma obra que não apenas honra seu legado, mas o expande com uma audácia artística e técnica impressionante. O filme não teme em explorar questões filosóficas sobre o bem e o mal, o livre-arbítrio e o destino, tudo isso embalado em um espetáculo visual que se destaca na animação global. É um testemunho do potencial ilimitado do cinema chinês em contar histórias com ressonância universal, provando que a complexidade narrativa e a inovação tecnológica podem coexistir harmoniosamente. Yu Yang entrega um filme que é um triunfo estético e narrativo, uma aventura adolescente que se eleva ao épico e que, sem dúvida, será lembrado como um marco na história da animação.

Ne Zha 2: O Renascer da Alma (哪吒之魔童闹海 – China, 2025)
Direção: Yu Yang
Roteiro: Yu Yang
Elenco: Lü Yanting, Han Mo, Hao Chen
Duração: 144 min.
Nota: ⭐⭐⭐⭐