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Crítica | Marvel Zumbis – 1ª Temporada

A incursão da Marvel no subgênero zumbi não é uma novidade para os leitores de quadrinhos, mas a transposição dessa premissa visceral para o universo animado do Disney+ com “Marvel Zumbis – 1ª Temporada” representa um divisor de águas. Dirigida por Bryan Andrews, que já havia explorado essa realidade distorcida no aclamado episódio “What If… Zombies?!” da série “O Que Aconteceria Se…?”, esta nova empreitada prometia aprofundar a barbárie e a complexidade moral que emergem quando os heróis mais poderosos da Terra se tornam as mais terríveis ameaças. O resultado é uma série que, ao mesmo tempo, satisfaz a sede por violência e horror explícitos e busca uma narrativa coerente dentro de sua premissa apocalíptica.

“Marvel Zumbis” mergulha em uma linha do tempo alternativa, cinco anos após o surto inicial que dizimou a civilização e transformou a maioria dos Vingadores em mortos-vivos vorazes. A série, que foi originalmente concebida como um filme, se desdobra em quatro episódios, cada um com aproximadamente 30 minutos, totalizando cerca de 125 minutos de duração. Bryan Andrews não apenas retorna à direção, mas também assume o papel de showrunner, com Zeb Wells como o roteirista principal, ambos fundamentais na construção dessa versão sombria do Multiverso Marvel. A narrativa acompanha um grupo resiliente de sobreviventes, incluindo jovens heroínas como Kamala Khan (Ms. Marvel, dublada por Iman Vellani), Riri Williams (Coração de Ferro, por Dominique Thorne) e Kate Bishop (Gaviã Arqueira, por Hailee Steinfeld), que se unem a figuras como Shang-Chi (Simu Liu) e Yelena Belova (Florence Pugh) em uma desesperada busca por uma cura ou um meio de pôr fim à praga zumbi. O elenco de voz, repleto de talentos que reprisaram seus papéis do live-action do MCU, contribui significativamente para a imersão, trazendo uma familiaridade reconfortante em um cenário desolador.

O roteiro de Zeb Wells se esforça para equilibrar a ação incessante e o gore explícito, característica que garantiu à série a classificação TV-MA, uma novidade para as animações da Marvel Studios. A série não se esquiva de mostrar a brutalidade da infecção, com momentos que subvertem as expectativas e demonstram que, nesse universo, nenhum herói está realmente seguro. Essa audácia em abraçar o horror é um dos pontos altos, diferenciando-a das produções mais contidas do MCU. Contudo, essa mesma ambição por vezes encontra limites na necessidade de avançar a trama, o que pode levar a um ritmo acelerado que nem sempre permite que o impacto emocional de certas perdas ou descobertas se assente por completo. A história expande o conceito do episódio de “What If…?”, prometendo explorar a fundo as consequências de um mundo onde superpoderes são usados para fins nefastos pela fome insaciável dos zumbis.

A direção de Bryan Andrews é competente em orquestrar as sequências de ação, que são muitas e frequentemente inventivas, aproveitando-se da liberdade que a animação oferece para explorar visuais grotescos e batalhas em grande escala. A cinematografia, embora não seja um termo tradicional para animação, se traduz em um design visual sombrio e atmosférico, que utiliza bem as sombras e os contrastes para realçar a sensação de perigo e desesperança. A trilha sonora complementa a atmosfera, com composições que transitam entre momentos de tensão e a urgência das fugas e confrontos. A série se destaca por dar espaço a personagens que, no universo live-action, muitas vezes permanecem nas margens, permitindo que eles liderem a narrativa e desenvolvam novas dinâmicas em face do apocalipse.

Um dos temas mais pungentes da série é a resiliência humana diante da adversidade extrema. O grupo de sobreviventes, composto em grande parte por uma nova geração de heróis, precisa forjar alianças improváveis e confrontar versões monstruosas de seus antigos mentores. A série aborda a ideia de que, mesmo em um mundo dominado pela morte, a esperança por uma solução e a luta pela vida persistem. No entanto, a série também flerta com uma ambiguidade moral interessante, ao sugerir que alguns dos zumbis ainda retêm fragmentos de sua inteligência e personalidade originais, o que adiciona uma camada de complexidade à simples dicotomia “bem contra o mal”. A Rainha Zumbi, Wanda Maximoff (dublada por Elizabeth Olsen), serve como uma antagonista central, cujos atos são impulsionados por uma versão distorcida de seu poder e sua dor, elevando o conflito para além de uma mera caçada a mortos-vivos.

Em essência, “Marvel Zumbis – 1ª Temporada” é uma experiência cinematográfica que entrega o que promete: uma visão brutal e sem rodeios de um universo Marvel consumido pela infecção zumbi. Embora sua duração concisa e o ritmo acelerado por vezes impeçam uma exploração mais profunda de certos arcos narrativos ou do impacto psicológico dos eventos em seus personagens, a série compensa com sequências de ação empolgantes, visuais impactantes e um elenco de voz que dá vida a essa distopia. É um lembrete contundente de que o Multiverso Marvel possui facetas muito mais sombrias do que as histórias heroicas usualmente apresentadas, e que a coragem pode ser encontrada mesmo nos cantos mais desolados. A série consegue se estabelecer como uma adição significativa ao cânone animado da Marvel, oferecendo um espetáculo de horror e ação que, apesar de suas pequenas imperfeições, é inegavelmente cativante.

Marvel Zumbis – 1ª Temporada (Marvel Zombies – Estados Unidos, 2025)
Direção: Bryan Andrews
Roteiro: Zeb Wells
Elenco: Iman Vellani, Dominique Thorne, Hailee Steinfeld, Florence Pugh, David Harbour, Simu Liu, Awkwafina, Randall Park, Elizabeth Olsen, Paul Rudd, Wyatt Russell, Tessa Thompson
Duração: 125 min.
Nota: ⭐⭐⭐⭐