Um dos maiores sofrimentos humanos é lidar com um amor que não deu certo. O pior é quando as lembranças do passado permanecem vivas, presentes em fotografias, lugares, músicas e momentos marcantes que jamais serão esquecidos. Muitas vezes, a solução mais fácil — e, talvez, a mais covarde — é fugir desses lugares que guardam tantas memórias. Esse é o dilema vivido pelo protagonista do filme A Vida dos Peixes, dirigido por Matías Bize, que aborda a temática do amor impossível e a possibilidade de transformá-lo com o passar do tempo.
Andrés (interpretado por Santiago Cabrera) é um jornalista que trabalha para uma revista de turismo e mora em Berlim. Durante sua última visita ao Chile, ele reencontra antigos amigos e troca com eles palavras que soam como despedidas, relembrando eventos do passado como se fossem estranhos que se encontraram apenas uma vez. Na mesma noite, já no fim da festa, Andrés encontra Beatriz (Blanca Lewin), seu grande amor, que agora é casada e mãe de duas filhas. O enredo se desenrola a partir dos diálogos e das tentativas de fuga dos dois durante essa noite especial.
O roteiro, assinado por Bize e Julio Rojas, é original e intenso. Os diálogos são realistas e tocam o público profundamente, pois tratam de um tema muito comum nos relacionamentos. Contudo, os roteiristas optaram por não criar grandes momentos de tensão, mantendo uma narrativa linear e dramática que pode incomodar o espectador. Ainda assim, essa escolha serve ao propósito da história: como peixes em um aquário, a vida dos protagonistas parece repetir um ciclo eterno, morrendo na despedida e renascendo a cada reencontro. Essa abordagem cria uma atmosfera quase claustrofóbica, levando o público a pensar que talvez não haja saída, que o casal deveria permanecer junto.
Apesar dessa sensação de destino inevitável, o final do filme pode ser interpretado como uma interrogação que desafia todas as certezas apresentadas. Ao analisar os personagens, percebe-se que Andrés é alguém desapegado, quase indiferente ao que acontece ao seu redor, e demonstra sentimentos mínimos e contidos para aqueles que ama. A atuação discreta de Santiago Cabrera reforça essa impressão. Por sua vez, Beatriz é uma mulher dividida entre o que a sociedade espera dela e o desejo pessoal de estar com o homem que sempre amou. Embora o filme pareça caminhar para um clichê shakespeariano, ele segue um caminho diferente, explorando o egoísmo do protagonista e a diplomacia da companheira para construir uma narrativa sobre vida e amor, e não apenas uma história repetitiva de relacionamentos turbulentos.
A direção de Matías Bize apresenta altos e baixos. As cenas mais intimistas entre Andrés e Beatriz são os pontos altos da obra, tanto na direção quanto no roteiro. A sequência inicial é particularmente impactante, pois oferece uma visão clara de quem é Andrés e do contexto do grupo que o cerca. As demais cenas, que mostram Andrés transitando pelos diversos cômodos da casa e encontrando pessoas e situações que evocam seu passado, são menos relevantes, funcionando como um baú de memórias que o protagonista precisa revisitar antes de retornar ao Velho Continente. Essa noite poderia representar um momento de amadurecimento para ele, mas seu comportamento egoísta e a interpretação contida de Cabrera deixam dúvidas no espectador, o que pode ser visto como positivo ou negativo, dependendo da percepção individual.
Um dos aspectos mais elogiáveis do filme é a trilha sonora e a fotografia, que se harmonizam com os ambientes. Na primeira parte, a iluminação forte predomina, enquanto na segunda metade, predominam cenas com penumbra, meia-luz e tons frios. A Vida dos Peixes é um filme intimista, que talvez não se destaque pela genialidade, mas que, pela soma de seus elementos, consegue transmitir uma força artística válida para provocar reflexões sobre o passado, a vida e o amor.
A Vida dos Peixes (La vida de los peces) – Chile, França, 2010
Direção: Matías Bize
Roteiro: Matías Bize, Julio Rojas
Elenco: Santiago Cabrera, Blanca Lewin, Victor Montero, Sebastián Layseca, Juan Pablo Miranda, Antonia Zegers, Matías Jara, Pedro del Carril, María Gracia Omegna, Alicia Rodríguez
Duração: 84 minutos
Perguntas Frequentes:
1. Qual é o tema central do filme “A Vida dos Peixes” e como ele é explorado na narrativa?
O filme aborda a temática do amor impossível e a dificuldade de lidar com relacionamentos que não deram certo, especialmente quando as lembranças permanecem vivas. A narrativa foca no reencontro entre Andrés e Beatriz durante uma noite, explorando suas emoções, diálogos intensos e a possibilidade de transformação do amor com o tempo.
2. Como são caracterizados os protagonistas Andrés e Beatriz em “A Vida dos Peixes”?
Andrés é um jornalista desapegado e quase indiferente, que expressa sentimentos mínimos, enquanto Beatriz é uma mulher dividida entre as expectativas sociais e seu desejo pessoal de estar com Andrés. Essa dualidade cria uma dinâmica complexa que fundamenta o drama do filme.
3. Quais são os destaques técnicos e artísticos do filme mencionados na análise?
A direção de Matías Bize destaca-se nas cenas intimistas entre os protagonistas, enquanto a trilha sonora e a fotografia harmonizam-se com os ambientes, alternando entre iluminação forte e tons frios na penumbra. Embora o filme não seja considerado genial, a soma desses elementos cria uma obra artística que provoca reflexões sobre passado, vida e amor.
- Nenhum índice disponível.