Séries com temática política estão se tornando cada vez mais raras na televisão. Isso pode ser resultado de uma demanda menor ou da dificuldade de abordar esse assunto de forma envolvente em um programa televisivo. Seja qual for a razão, poucos produtores arriscam investir em produções que exploram os meandros do jogo político.
Boss, série do canal Starz que já teve sua segunda temporada confirmada, é uma dessas raras produções políticas atuais. Criada pelo estreante na TV Farhad Safinia e contando com Gus Van Sant e Kelsey Grammer como produtores, a série tem conquistado tanto públicos exigentes quanto aqueles que não são fãs habituais de tramas densas ou intelectualmente complexas.
A história gira em torno de Tom Kane, prefeito de Chicago, que recebe um diagnóstico de uma doença degenerativa incurável. Mantendo essa condição em segredo, ele continua a atuar no cenário político, marcado por corrupção e manipulações. À medida que a doença avança, Kane torna-se cada vez mais paranoico, e suas ações ganham um tom mais emocional e pessoal. Movido por uma ambição insaciável, ele fará de tudo para permanecer no comando da terceira maior cidade dos Estados Unidos.
Kelsey Grammer é o destaque absoluto, interpretando com grande habilidade o maquiavélico e condenado Tom Kane, cujo perfil lembra o personagem criado por Orson Welles. Grammer entrega um desempenho à altura de um Rei Lear moderno e urbano, conforme a visão dos produtores para o papel. Diferentemente de um líder que delega para se afastar, seu personagem reforça seu controle, manipulando todos ao seu redor para manter seu domínio. O Globo de Ouro recebido pelo ator comprova a excelência de sua atuação. O público chega a sentir uma antipatia genuína pelo personagem, que muitas vezes se mostra odioso em sua teatralidade, silêncio e impassibilidade. Em sua primeira experiência dramática na televisão, Grammer impressiona e dá à série seu tom essencial.
Situada em um ambiente urbano, com centros comerciais, milhões de habitantes e uma variedade de problemas, a série poderia facilmente se perder em sua própria ambição, tentando abordar muitos temas sem aprofundar nenhum deles. No entanto, os roteiristas equilibram elementos políticos — como a disputa nas eleições primárias para governador e a menção à corrida para a prefeitura do ano seguinte — com romances, intrigas governamentais e a exploração de favores, corrupção e manipulação de pessoas, mídia e instituições para preservar o sistema político vigente. Em vários aspectos, Boss lembra o filme Tudo Pelo Poder, estrelado por George Clooney.
Embora a estrutura do enredo seja sólida e revele o impacto da política sobre as pessoas, o roteiro falha no desenvolvimento de algumas tramas individuais. Para tornar a narrativa mais interessante, foram inseridas diversas intrigas na cidade de Chicago, mas em certos momentos alguns desses enredos foram esquecidos, enquanto outros, que poderiam ser resolvidos rapidamente, receberam atenção excessiva. Apesar disso, não se pode falar em enrolação, pois os episódios são bem escritos e se conectam ao arco geral da série. Contudo, para quem esperava um equilíbrio maior no desenvolvimento das histórias, a sensação de frustração surgiu rapidamente.
O episódio piloto, dirigido por Gus Van Sant, traz a marca registrada do diretor: uma câmera detalhista e cheia de close-ups em olhos, bocas, mãos e objetos do cenário que aparecem com frequência ao longo dos episódios. Essa abordagem cria uma atmosfera teatral e cinematográfica, com planos invasivos que aproximam o espectador dos personagens, facilitando a identificação com eles.
Apesar das falhas no roteiro, os dois últimos episódios compensam a espera, entregando reviravoltas e momentos de suspense que deixam o público ansioso pela sequência. No geral, Boss é uma produção excelente, que aborda um tema complexo e pouco explorado na televisão, trazendo uma realidade política que, apesar das especificidades locais, pode ser aplicada a sistemas políticos ao redor do mundo.
Além da brilhante atuação de Grammer, merecem destaque Martin Donovan como Ezra Stone, conselheiro do prefeito; Connie Nielsen no papel de Meredith Kane, esposa do prefeito; e Kathleen Robertson como Kitty, secretária geral e porta-voz. A única escolha questionável do elenco foi Jeff Hephner como Zajac, um jovem político ambicioso. Sua caracterização não convence totalmente, já que suas atitudes não condizem com as responsabilidades que almeja, sugerindo que um ator mais experiente poderia ter trazido mais verossimilhança ao personagem.
A fotografia da série prioriza o naturalismo urbano, sem grandes efeitos ou composições complexas. O design de arte e figurino também seguem uma linha prática e realista, tanto na decoração dos ambientes quanto nas roupas dos personagens e nas locações, todas ambientadas em Chicago.
Boss é uma série impactante que derruba a ingenuidade dos eleitores e dos cidadãos apáticos. Vale a pena assistir, pois traz à tona uma realidade política pouco mostrada, especialmente nos Estados Unidos. Com a segunda temporada em produção, resta torcer para que o enredo ganhe maior coesão, mantendo a crítica social afiada apresentada na primeira temporada, e que o “reino de satã”, como diz a música de abertura, venha a ruir.
Boss – 1ª Temporada (EUA, 2011)
Direção: Diversos
Duração: 400 minutos
Perguntas Frequentes:
1. Qual é a temática principal da série Boss e qual personagem central ela acompanha?
A série Boss tem como temática principal a política, focando nos bastidores e nas complexidades do poder. A história acompanha Tom Kane, prefeito de Chicago, que luta para manter seu controle sobre a cidade enquanto enfrenta uma doença degenerativa incurável.
2. Quem são os principais atores da série e quais destaques de atuação existem?
Kelsey Grammer é o destaque principal, interpretando o maquiavélico Tom Kane com uma atuação que lhe rendeu um Globo de Ouro. Outros atores importantes são Martin Donovan (Ezra Stone), Connie Nielsen (Meredith Kane) e Kathleen Robertson (Kitty). A única escolha de elenco mais questionável foi Jeff Hephner como Zajac.
3. Como é o estilo visual e narrativo da série Boss?
A série adota uma fotografia naturalista e realista, com ambientes e figurinos que refletem a atmosfera urbana de Chicago. A direção, incluindo o episódio piloto por Gus Van Sant, usa muitos close-ups para criar uma atmosfera teatral e aproximar o espectador dos personagens. O roteiro equilibra temas políticos com intrigas pessoais, embora apresente algumas falhas no desenvolvimento de tramas secundárias.
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