“Não roubarás“.
Inspirado no claustrofóbico filme argentino 4X4 (2019), Confinado traz uma premissa instigante que desperta o interesse imediato do público: a história de um ladrão preso dentro de um carro transformado em armadilha física e psicológica. Com Bill Skarsgård e Anthony Hopkins no elenco, a produção começa com uma energia que promete um embate moral e emocional intenso, explorando as tensões sociais que colocam vítima e algoz frente a frente. No entanto, apesar do potencial, o filme hesita em aprofundar seus temas, resultando numa narrativa que não corresponde às expectativas geradas.
A trama gira em torno de Eddie, um pai enfrentando dificuldades financeiras que, ao tentar roubar um SUV de luxo, acaba capturado numa armadilha sádica criada por William, um vigilante movido por uma visão distorcida de justiça e sede de vingança. Embora a ideia inicial seja atraente, a execução deixa a desejar, entregando apenas uma fração do que poderia ser, causando frustração.
O destaque dramático está na atuação de Skarsgård, que mantém o filme com uma intensidade visceral, limitado ao espaço confinado do veículo. Ele consegue transmitir a angústia de alguém preso não só fisicamente, mas também pelas circunstâncias de uma vida marginalizada e sem perspectivas. As interações com a voz ameaçadora de Hopkins, que interpreta William, são um dos pontos altos nos minutos iniciais. Esses diálogos tocam em temas como violência urbana, falhas do sistema judicial e policial, e as desigualdades que alimentam o ciclo vicioso de crime e punição. Inicialmente, parecia que o filme se aventuraria por uma reflexão mais profunda sobre as causas estruturais do conflito, mas essa promessa se esvai à medida que o roteiro de Michael Arlen Ross perde força e se estagna.
Tecnicamente, alguns elementos ajudam a fortalecer a ideia central, especialmente na primeira metade do filme. A montagem intercala ângulos internos que ressaltam a claustrofobia de Eddie com cenas externas que contextualizam o cenário urbano degradado onde a história ocorre. A fotografia cria um contraste visual marcante entre o SUV reluzente e o entorno sujo e grafitado, usando tons frios e um verde doentio que reforçam a luta de classes abordada no roteiro. Em momentos como uma sequência inicial em plano-sequência, a câmera circula Skarsgård, capturando sua crescente ansiedade e reforçando a sensação de aprisionamento. Contudo, nada disso consegue esconder a narrativa medíocre que se instala na segunda metade, quando o filme passa a repetir ideias e recorrer a provocações superficiais que não se desenvolvem.
A dinâmica entre Eddie e William perde força quando o roteiro opta por um moralismo simplista. William expressa desprezo pelos menos favorecidos e se apoia em conceitos de meritocracia e uma simplista oposição entre “bem e mal” para justificar seus próprios atos, sem que o filme questione ou desconstrua essas ideias. A narrativa flerta com debates sobre responsabilidade individual, mas logo recua, oferecendo soluções que reduzem questões sociais complexas a lições infantis sobre honestidade e redenção. Quando os personagens finalmente se encontram, as atuações de Skarsgård e Hopkins brilham, mas o filme já não consegue se recuperar.
É decepcionante como David Yarovesky (diretor também de Brightburn – Filho das Trevas) conduz o desfecho de Confinado, comprometendo a tensão construída. A mudança de cenário no final é abrupta, e o ritmo da ação se torna desconexo, como se o filme quisesse acabar rápido, deixando pontas soltas após repetir dilemas por muito tempo. O que poderia ser um suspense provocador sobre justiça, criminalidade e desigualdade termina reduzido a um clichê moralista do tipo “roubar é errado, não faça isso!”. Mesmo com a dupla principal de atores e alguns méritos técnicos, a obra não consegue ir além do óbvio, deixando a sensação de que a trama desistiu de se aprofundar logo após os primeiros 30 minutos. É mais um exemplo de produção que escolhe o caminho fácil — agradar o público com a redenção do herói — e sacrifica aquilo que tinha de mais interessante.
Confinado (Locked) — EUA, Canadá, 2025
Direção: David Yarovesky
Roteiro: Michael Arlen Ross (baseado no roteiro de Mariano Cohn e Gastón Duprat)
Elenco: Bill Skarsgård, Anthony Hopkins, Ashley Cartwright, Michael Eklund, Navid Charkhi, Ricardo Pequenino, Gaston Morrison, entre outros
Duração: 95 min.
Qual é a premissa central do filme “Confinado” e em que ele se inspira?
“Confinado” é inspirado no filme argentino “4X4” (2019) e apresenta a história de um ladrão, Eddie, que fica preso dentro de um carro transformado em armadilha física e psicológica. O filme explora o conflito entre vítima e algoz, abordando temas como violência urbana, justiça e desigualdade social.
Como são as atuações e o desempenho técnico do filme?
Bill Skarsgård entrega uma atuação intensa e visceral, transmitindo a angústia do personagem confinado, enquanto Anthony Hopkins contribui com uma voz ameaçadora que marca os diálogos iniciais. Tecnicamente, a montagem e a fotografia reforçam a claustrofobia e o contraste social, especialmente na primeira metade do filme, com destaque para uma sequência em plano-sequência que intensifica a ansiedade do protagonista.
Quais são as principais críticas feitas ao roteiro e desenvolvimento de “Confinado”?
Apesar do potencial da premissa, o filme é criticado por não aprofundar seus temas sociais e morais, optando por um moralismo simplista que reduz questões complexas a lições superficiais sobre honestidade e redenção. O roteiro perde força na segunda metade, repetindo ideias e apresentando um desfecho abrupto e desconexo que compromete a tensão construída, resultando numa narrativa mediana que não corresponde às expectativas iniciais.