O sucesso de 007 Contra o Satânico Dr. No foi tão expressivo que, apenas um ano após sua estreia, uma sequência já estava nos cinemas, desta vez com um orçamento que dobrou em relação ao primeiro filme. Ainda mais surpreendente é o fato de que a franquia, que começou com uma história um pouco simplória, praticamente pulou as fases iniciais e amadureceu rapidamente, adotando um tom mais adulto e sofisticado. Curiosamente, não houve renovação na equipe: toda a equipe original retornou, incluindo o diretor Terence Young e os roteiristas.
O resultado foi Moscou Contra 007, que permanece até hoje como um dos melhores filmes do icônico espião da literatura e do cinema. O filme começa com uma das famosas cenas pré-créditos que se tornaram marca registrada da série. Nessa sequência, vemos 007 ser aparentemente assassinado por Grant, personagem interpretado por Robert Shaw — o mesmo ator que fez o durão pescador Quint em Tubarão. Claro que tudo isso faz parte de um treinamento orquestrado pela organização criminosa S.P.E.C.T.R.E. (cuja sigla é uma divertida mistura em inglês: Special Executive for Counter-intelligence, Terrorism, Revenge and Extortion). O objetivo é preparar um plano elaborado para vingar a morte do Dr. No e roubar a Lektor, uma máquina capaz de decodificar códigos soviéticos.
Apesar de colocar Bond em confronto direto com a União Soviética, o roteiro surpreende por sua coerência e fluidez, fugindo daquele clichê exagerado de “dominação mundial”. A Guerra Fria, que estava no auge na época, é habilmente incorporada à trama, tornando tudo mais crível do que a ilha misteriosa e protegida por um dragão fumegante do filme anterior. É neste longa que temos a primeira menção à divisão Q, que depois daria origem ao famoso personagem Q, e onde 007 recebe seu primeiro gadget: uma maleta com faca embutida, moedas de ouro (!) e uma bomba de gás lacrimogêneo.
Sean Connery, mais à vontade no papel do espião, amadurece junto com a franquia. Com esse filme, ele se consolida como o “modelo de Bond” que conhecemos, bem diferente do personagem dos livros, o que desagradava Ian Fleming, que nunca concordou plenamente com a escolha do ator.
Embora a primeira Bond Girl, Sylvia Trench (Eunice Gayson), reapareça, os roteiristas optaram sabiamente por focar quase que exclusivamente em Tatiana Romanova (Daniela Bianchi) como a principal interesse amoroso de 007. Essa fidelidade aparente do espião permite uma maior conexão com a personagem feminina central, que desempenha papel fundamental na trama como uma peça da organização inimiga. Bianchi pode não ter o mesmo carisma de Ursula Andress, mas sua personagem é mais complexa e multifacetada, diferentemente da mais simplista Honey Ryder.
No elenco principal, destacam-se também Pedro Armendáriz como o simpático agente turco Kerim Bey e Lotte Lenya, que interpreta a marcante e um tanto caricata agente da S.P.E.C.T.R.E., Rosa Klebb.
Com locações na Turquia, Moscou Contra 007 (título que poderia ter sido mais criativo na tradução do original em inglês) apresenta paisagens deslumbrantes e uma das cenas mais famosas da série, passada dentro do luxuoso Orient Express. Nessa parte, o roteiro desenvolve a narrativa a cada parada do trem, culminando em um clímax contido, realista e eficiente, que envolve o confronto entre Bond e Grant. A química entre Connery e Shaw é notável, e os dois convencem como agentes opostos que possuem habilidades e inteligência equivalentes. São momentos de diálogos polidos que culminam em combates corporais bem coreografados e inesquecíveis.
No entanto, a história poderia ter terminado ali. Não satisfeitos, os roteiristas estenderam a sequência do trem para cenas em outras locações, dando um tom mais grandioso ao desfecho. Infelizmente, isso prejudica o impacto do clímax, pois as perseguições e explosões seguintes roubam o fôlego do espectador, não deixando espaço para assimilar as consequências do que foi apresentado antes. Embora a ação não seja tão exagerada quanto as que vemos em filmes atuais, essas cenas parecem um complemento de última hora, talvez para agradar algum produtor exigente.
Apesar desse final menos inspirado, Moscou Contra 007 continua sendo um excelente filme de ação, que só pode desapontar aqueles que procuram uma narrativa ou ritmo semelhantes aos dos longas do século XXI.
Ficha técnica:
Moscou Contra 007 (From Russia With Love, Inglaterra, 1963)
Direção: Terence Young
Roteiro: Richard Maibaum, Johanna Harwood
Elenco: Sean Connery, Daniela Bianchi, Pedro Armendáriz, Lotte Lenya, Robert Shaw, Bernard Lee, Eunice Gayson, Walter Gotell, Francis De Wolff, George Pastell, Nadja Regin, Lois Maxwell
Duração: 115 minutos
Perguntas Frequentes:
1. Qual foi o impacto do sucesso de “007 Contra o Satânico Dr. No” na produção de “Moscou Contra 007”?
O sucesso expressivo do primeiro filme permitiu que a sequência “Moscou Contra 007” fosse lançada apenas um ano depois, com um orçamento que dobrou em relação ao original. A franquia amadureceu rapidamente, adotando um tom mais adulto e sofisticado, mantendo a mesma equipe de direção e roteiristas.
2. Como “Moscou Contra 007” incorpora elementos da Guerra Fria na sua trama?
O filme coloca James Bond em confronto direto com a União Soviética, integrando o contexto da Guerra Fria de forma coerente e fluida, evitando clichês exagerados de dominação mundial. Isso torna a trama mais crível em comparação ao filme anterior, ambientado em uma ilha misteriosa.
3. Quais são as principais novidades na personagem de James Bond e nos gadgets apresentados em “Moscou Contra 007”?
Sean Connery amadurece no papel, consolidando-se como o modelo icônico de Bond, diferente do personagem dos livros. O filme apresenta a primeira menção à divisão Q e introduz o primeiro gadget de 007: uma maleta contendo uma faca embutida, moedas de ouro e uma bomba de gás lacrimogêneo.
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